Cápsula do Tempo
Aviso legal: Esta é uma obra de ficção, qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.
Em 2011, a primeira mulher a se tornar presidente do Brasil, toma posse. O terrorista líder dos ataques do 11 de setembro, é morto. “O Discurso do Rei” vence como melhor filme. A Croácia entra para a União Europeia... Dentre tantos acontecimentos de relevâncias variadas, há uma pequena turma de jovens, do interior de Minas Gerais, que vive um momento próprio significativo: o último ano na escola.
Talvez, naquele universo adolescente, nenhuma das notícias que abalaram o mundo, possa ter tido algum impacto na vida deles.
Os jovens estavam preocupados em que faculdade escolher para, consequentemente, saber que profissão seguir. Eles estavam mais preocupados em fazer uma maquete da bomba atômica em escala de 1 por 1, para apresentarem na feira de ciências. Além do mais, pode-se acreditar que eles estavam ainda mais preocupados em comemorar estarem vivos às 11 horas e 11 minutos, do dia 11 de novembro daquele ano.1
A partir do ano seguinte, muitos deles vão se separar e, quem sabe, nunca mais vão se encontrar novamente.
Sendo assim, com um ano tão importante se aproximando do fim, o grupo tem a ideia de fazer uma cápsula do tempo. Não tão elaborada quanto guardarem pertences e mensagens numa caixa metálica e enterrarem no pátio da escola, mas cada um do grupo escrever, para si, uma carta que será lida dez anos depois, quando eles forem se reunir novamente.
Há um adolescente, em específico, que tem objetivos bem traçados para o futuro. Ele já sabe que quer se mudar para São Paulo, cursar Design Gráfico e, com um pouco mais de tempo e esforço, acabar se tornando diretor de arte da Superinteressante.
Sem demora, ele talvez seja o que termina de escrever primeiro. Para coroar a atividade, ele faz um desenho de si com uma frase, para que seja dita por aquele personagem desenhado, dez anos depois. Como um detalhe singelo, o jovem dobra o papel, guardando a frase e o desenho em seu interior, mas deixando um pequeno espaço por onde um dos olhos do personagem fica visível, possibilitando uma brincadeira de associação com a frase escrita logo acima de sua cabeça.
Ele não precisa dizer a ninguém algo como “a carta para o meu eu do futuro continha um plano” quando ela fosse lida uma década depois. Ele guarda o sentimento consigo, com a maior certeza do mundo de que alcançará tudo o que fora descrito naquela folha de papel.
Com isso, ele segue os próximos anos perseguindo os seus objetivos.
Entretanto, assim como a inocência dos jovens em se preocuparem com profissões, maquetes e datas, a inocência daquele adolescente decidido, 10 anos depois das cartas escritas, tem sua última pequena parte deixada para trás.
Em 2021, ele se encontra no meio de uma pandemia global, não exercendo mais a exata profissão pela qual almejou e executou por algum tempo e vendo a revista que tanto amava, minguar junto com outros veículos impressos. É verdade que ele conseguiu se mudar para cidade que queria, mas não é somente aquela questão que o manteria feliz, ao se encontrar onde estava.
Em 2011, ele não fazia ideia de que pagar as contas e se sustentar, sem a ajuda de ninguém, pudesse ser tão reconfortante. Ele não fazia ideia de que um diretor de arte de uma revista, mal executasse algum design. Não fazia ideia de que, simplesmente, ter um gato junto com uma mulher que ele ama, pudesse trazer tanto significado para sua vida. Ele mal sabia que parte de sua maturidade viria como consequência de uma doença, afinal, se o clichê de que coisa ruim faz a gente crescer não fosse verdade, então não seria um clichê.
Apesar de tudo isso, ele faz sim ideia de que escrever um relato como este, pode fazer sentido somente para ele. Ele, inclusive, pensa que seria divertido escrever um disclaimer no início de um relato, propondo que tudo ali escrito é, na verdade, uma ficção e, assim, fazendo daquela nota a única ficção escrita. Acima de tudo, ele sabe que em algum momento, seus devaneios devem cessar para que ele volte ao cerne do tema…
A leitura das cartas daquela turma de jovens ainda segue indefinida. A inocência deles também não contava que seria tão difícil reunir um grupo de adultos.
O adulto em específico que viu sua vida seguir um rumo diferente daquele traçado na adolescência, olha com ternura para o seu eu do passado. Assim como aquele jovem de 2011 não contava com as felicidades e os problemas que pudessem surgir da vida que ele traçou na carta (e também com a que não traçou), ele também não fazia ideia de que a vida seguir seu curso natural e trazer novos objetivos, pudesse fazer ainda mais sentido do que almeja o nosso breve eu atual.
Te vejo no futuro.
Patrick.
Teriam eles a mesma felicidade no ano de 1111?